terça-feira, 9 de março de 2010

Memórias do Vale do Iguaçu

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Qual é o lugar da poesia na sala de aula? Muitas ações ainda se enveredam pelos caminhos do estabelecido, bem conceituado e criticamente aceito. Muitos jovens desconhecem a poesia de nossa região pelo fato de na escola o grande poeta ser quase sempre o poeta consagrado, ou o poeta morto. Muitos dos que fazem poemas sem intenção editorial ficam no esquecimento, e belas peças da poesia sucumbem no anonimato, pelo desconhecimento de escritores que acontecem em nossas proximidades. Ainda na mesma linha encara-se, muitas vezes, o fazer poético com o que diz respeito ao mundo clássico e seus sucessores, as escolas literárias e as poesias didáticas, não se atendo ao fato de que muitos livros não vistos pelo prisma da poesia tradicional são belíssimas construções poéticas.
Auerbach no livro Mimesis ressalta o valor das narrativas do Antigo Testamento, opondo-as às narrativas homéricas. O crítico alemão busca, numa fonte poética alternativa do mundo clássico, a palavra poética que perfaz nos ouvintes elementos não presentes na tradição da Odisséia, como o não-dito, o não expresso explicitamente pelas vozes que permeiam os textos.
Nas universidades os poetas da geração de 22 só foram estudados nos anos 60, quatro décadas depois do estopim do grupo modernista. No lugar deles ainda imperava a poesia do século XIX, considerada por muito tempo quase que a única maneira de se versar sobre o homem e o mundo. Se isso aconteceu nos meios acadêmicos, donde emanam muitas teorias e abordagens para o ensino e apreensão do fenômeno poético, nas escolas de Ensino Fundamental a poesia ou era desculpa para se ensinar gramática, ou era confundida com versos metrificados e rimados em cadências que buscavam a forma perfeita. O resultado em muitos casos é pensar que poesia é coisa do passado, ultrapassada, algo totalmente fútil aos nossos anseios atuais gerando aversão por parte dos estudantes. Muitos dos alunos que dizem não gostar de poemas são os mesmos que desabafam em verso ou prosa nos seus cadernos, nas margens dos cadernos escolares, nas anotações de pensamentos, porque pra eles é instaurada a noção de que poesia é rima, perfeição formal e decoro. Escrevem poesia sem saber, defendem a poesia das teorias clássicas, dos decoros.
Felizmente, muitos professores das escolas de nossas cidades têm um pensamento diferenciado. Mostram a poesia não como algo estático; promovem a liberdade de criação em verso ou prosa.
Pensando na poesia de nossas cidades foi desenvolvido o projeto Memórias Poéticas do Vale do Iguaçu, no qual acadêmicos da FAFIUV buscam o encontro com escritos de nossos conterrâneos para depois trabalhar em apresentações em sala de aula, em oficinas de poesia com os estudantes do Ensino Fundamental. Levar ao estudante a poesia pulsante de nossos escritores e aos alunos propor a valorização desses poetas é o objetivo de professores do Curso de Letras, apoiados pelos professores de língua portuguesa da região e por estudiosos e diletantes da poesia, que vêem no resgate mais que uma simples ação pedagógica: um compromisso com a história de nossas cidades. Seguindo os passos de uma primeira antologia, organizada dentre outros pela professora Fahena Porto Horbatiuk, será lançada a segunda, na qual constarão trabalhos de poetas de nossas cidades e mostrará aos jovens que a poesia é pulsante e também está próxima de nós.
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Prof. Josoel Kovalski
Prof. de Literatura da FAFIUV
(O texto foi originalmente publicado no jornal Caiçara, da cidade de União da Vitória, em 05 de março de 2010)
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